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quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Desmascarada: Doutrina Trump e a carnificina do neoeixo do mal, por Pepe Escobar

Pepe Escobar, Asia Times (reproduzido em The Vineyard of the Saker)

Traduzido pelo coletivo da vila vudu

Nada de "discurso profundamente filosófico". Sequer um show de "realismo com princípios" – como a Casa Branca havia espalhado. O presidente Trump na ONU foi de "carnificina à EUA", tomando emprestada a expressão do autor de discursos e nativista Stephen Miller.
É preciso deixar 'baixar' a enormidade do que acaba de acontecer, devagar. O presidente dos EUA, diante da burocracia enfatuada que se faz passar por "comunidade internacional", ameaçou "varrer do mapa" toda a República Popular Democrática da Coreia (25 milhões de almas, metade da população do estado de São Paulo, NTs). E também varrerá (se varrer a Coreia do Norte) vários outros milhões de sul-coreanos como dano colateral.
Houve várias tentativas para conectar as ameaças de Trump à teoria do doido [ing. madman theory] urdida por "Tricky Dicky" [aprox. "Esperto Otário/Pintudo"] Nixon mancomunado com Henry Kissinger, segundo a qual a URSS deveria ser mantida sob a impressão de que o então presidente dos EUA fosse doido varrido, o suficiente para, literalmente, despachar a bomba atômica. Mas a RPDC não se impressionará muito com o novo doido, remix.

Com o que ficamos, sobre a mesa, com atualização muito mais apavorante de Hiroshima e Nagasaki (Trump repetidas vezes invocou Truman em seu discurso). Nesse momento está em curso uma atividade frenética nas duas capitais, Moscou e Pequim: Rússia e China têm em desenvolvimento estratégia própria de estabilidade/conectividade para conter Pyongyang.

A Doutrina Trump foi finalmente anunciado e foi delineado um novo eixo do mal. Os estados contemplados agora são Coreia do Norte, Irã e Venezuela. A Síria de Assad é uma espécie de mini-mal, assim como Cuba. Crucialmente, Ucrânia e Mar do Sul da China só receberam rápida menção de Trump, sem nenhuma acusação violenta contra Rússia e China. Pode indicar pelo menos algum grau de realpolitik: sem "RC" – a parceria estratégica Rússia-China no coração do bloco RICS (os BRICS, excluído o Brasil (B) que está sob golpe e fora da ordem civilizada) e a Organização de Cooperação de Xangai (OCX) – o impasse na Península Coreana não tem solução possível.

Essa batalha épica entre "os corretos muitos" e os "perversos poucos", com os EUA autodescritos como "nação compassiva" que quer "harmonia e amizade, não conflito e luta", e que fica apenas a um passo de pintar o Estado Islâmico como nem remotamente tão "o mal" quanto a Coreia do Norte ou o Irã – ocupa só uns poucos parágrafos.

A arte de desmontar um acordo

Segundo a Doutrina Trump, o Irã é "estado-bandido completamente exaurido economicamente, cujos principais itens de exportação são violência, banhos de sangue e caos", "regime assassino" que se aproveita de um acordo nuclear que é "um embaraço para os EUA."

O ministro de Relações Exteriores do Irã Mohammad Javad Zarif tuitou:



"O discurso de ódio ignorante de Trump, coisa de tempos medievais – sem lugar na ONU no século 21 – não vale nem resposta."

O ministro de Relações Exteriores da Rússia Sergey Lavrov mais uma vez reafirmou total apoio ao acordo nuclear, antes da reunião de ministros P5+1 marcada para 4ª-feira, quando Zarif estará sentado na mesma mesa que o secretário de Estado dos EUA Rex Tillerson. Estará em discussão a confirmação do acordo. Tillerson é o único que quer uma renegociação.

O presidente Hassan Rouhani do Irã construiu de fato um argumento inexpugnável sobre as negociações nucleares. Diz que o acordo – que todos, o grupo P5+1 e a Agência Internacional de Energia Atômica, concordam que está funcionando bem – poderia ser usado como modelo em outras questões. A chanceler Angela Merkel da Alemanha concorda. Mas, diz Rouhani, se os EUA resolvem desligar-se unilateralmente do acordo, de que modo os norte-coreanos, algum dia, acreditariam que valha a pena sentar e negociar qualquer coisa com os norte-americanos?

A Doutrina Trump visa de fato a retomar um velho enredo favorito dos neoconservadores, que reverte à dinâmica dos anos da Guerra Fria manobrada pela Washington de Dick Cheney.

O roteiro é o seguinte: o Irã tem de ser isolado (pelo ocidente, mas dessa vez a ideia não decola entre os europeus); o Irã está "desestabilizando" o Oriente Médio (mas a Arábia Saudita, sustentáculo ideológico de todos os ramos de jihadismo salafista, ganha entrada grátis para desestabilizar à vontade); e o Irã, porque está desenvolvendo balística que pode – supostamente – transportar ogivas nucleares, é a nova Coreia do Norte.

Assim se prepara o terreno para Trump des-assinar o acordo dia 15 de outubro. Esse perigoso resultado geopolítico poria então Washington, Telavive, Riad e Abu Dhabi contra Teerã, Moscou e Pequim, com as capitais europeias não alinhadas. Nada que seja, nem de longe, compatível com uma "nação compassiva" que queira "harmonia e amizade, não conflito e luta."

O Afeganistão muda-se para a América do Sul 

A Doutrina Trump, como enunciada, privilegia(ria) a soberania absoluta do estado-nação. Mas aí vêm os amaldiçoados "regimes bandidos", regimes que têm de ser, como se diz, "mudados". Entra a Venezuela, agora "à beira de colapso total" e comandada por um "ditador"; e os EUA, naturalmente, "não podem sentar à margem e apenas assistir aos eventos".

Não estão, mesmo, sentados à margem. Na 2ª-feira, Trump jantou em New York com os presidentes de Colômbia, Peru e Brasil (esse último acusado pelo advogado geral de ser o cabecilha de uma organização criminosa, e que padece hoje 95% de impopularidade, o exato oposto da dinastia Kim na Coreia do Norte, que recebeu 95% de "boa" e "excelente" na avaliação dos próprios cidadãos). No cardápio dessas sumidades: mudança de regime na Venezuela.

Mas o "ditador" venezuelano, presidente Maduro, conta com o apoio de Moscou e, mais crucialmente importante, também de Pequim, que compra petróleo e investiu muito em infraestrutura no país, com a gigante brasileira da construção que foi completamente desarticulada pela investigação Lava Jato.

Os riscos na Venezuela são extremamente altos. No início de novembro, forças do Brasil e dos EUA farão manobras militares conjuntas na Floresta Amazônica, na Tríplice Fronteira entre Peru, Brasil e Colômbia. Podem chamar de 'ensaio' para mudança de regime na Venezuela. A América do Sul corre alto risco de ser convertida em neo-Afeganistão, consequência que decorre da frase de Trump, para quem "grandes porções do mundo estão em conflito e algumas, de fato vão é p'rô inferno".

Apesar de todo o arrogante fraseado sobre "soberania", esse neoeixo do mal só tem a ver, mais uma vez, com mudança de regime.

Rússia-China trabalham para diluir o impasse nuclear, depois seduzir a Coreia do Norte para que tome parte na interpenetração de Iniciativa Cinturão e Estrada, ICE, e União Econômica Eurasiana (UEE), via uma nova Ferrovia Trans-Coreia e investimentos em portos da RPDC. O nome do jogo é integração eurasiana.

O Irã é nodo chave da ICE. Também é futuro membro pleno da OCX; conecta-se – pelo Corredor de Transporte Norte-Sul – com Índia e Rússia; e é possível futuro fornecedor de gás natural para a Europa. Outra vez, o nome do jogo é integração eurasiana.

A Venezuela, por sua vez, é dona das maiores reservas de petróleo ainda não exploradas do planeta, e entra nos planos de Pequim como uma espécie de nodo avançado da Iniciativa Cinturão e Estrada na América do Sul.

A Doutrina Trump introduz um novo conjunto de problemas para Rússia-China. 


Putin e Xi sonham com remontar um equilíbrio de poder semelhante ao do Concerto da Europa, que durou de 1815 (depois da derrota de Napoleão) até o início da 1ª Guerra Mundial em 1914. Foi quando Grã-Bretanha, Áustria, Rússia e Prússia decidiram que nenhuma nação europeia deveria poder repetir a hegemonia que a França tivera sob Napoleão. Sentada como juíza e carrasca, a América "compassiva" de Trump certamente parece decidida a ecoar aquela hegemonia napoleônica.

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